top of page

O ciclo inesgotável da intolerância.

  • Foto do escritor: Mauro Vinicius de Souza
    Mauro Vinicius de Souza
  • 11 de jan. de 2017
  • 5 min de leitura

Henrique nasceu saudável e, como todo bebê, com aquela paz e tranquilidade que somente a inocência de um recém-nascido pode emanar. Nasceu em São Paulo em um hospital na Zona Leste, havia sido concebido, acidentalmente, 38 semanas atrás após uma festa. Sua mãe era uma menina de 17 anos, com pouco estudo como quase todos naquela festa, o pai era um homem de 28 anos que se aproveitara da inocência de sua mãe que bebeu demais e desde que soube da gravidez, não aceitava Henrique como filho. Por outro lado, sua mãe, como qualquer outra mãe, o amava, mesmo sem nunca ter aprendido o que é dedicar amor ao filho. A menina mãe viu seu pai morrer cedo, vítima de um equívoco policial e sua mãe, que vivia de pensão do Estado e dos tantos outros auxílios populistas mantidos por este, estava sempre enfiada em alguma festa que durava a madrugada toda e, para completar, vez e outra levava homens estranhos para sua casa. Casa que agora seria de Henrique também, ficava em um bairro sem saneamento básico, acesso à estrutura da cidade, cultura, saúde ou qualquer escola com educação de qualidade.


Ausência do Estado, violência, culto ao crime, aliciamento, falta de estudos, fome, abuso de autoridade, esquecimento, depravação, bala perdida, tudo isso fez parte da infância de Henrique, aos quatro anos viu e ouviu imóvel e assustado sua mãe ser estuprada por um dos homens que a avó havia levado pra casa, injustamente, na adolescência, muitas vezes foi tratado como bandido, tomando tapa de policial por estar na rua na hora em que disseram que ele não deveria estar. A rua era tudo que ele tinha! Rua onde viu alguns amigos morrendo e outros matando, presenciou tantos tiroteios que era impossível contar, para estudar tinha que pegar quatro ônibus, dois para ir e dois para voltar, foi descriminado por ser pobre, por muitas vezes teve que brigar com garotos que chamavam sua mãe dos mais diversos nomes. Estudava numa escola desamparada pelo poder público onde as aulas que corriam de forma normal eram raras, era o melhor que lhe ofereciam. Ainda assim Henrique sonhava! Queria tirar a mãe daquele lugar, buscar ajuda para avó e quem sabe ter sucesso um dia, passava as horas que tinha dentro do ônibus imaginando como seria bom quando esse dia chegasse! Mas o futuro era incerto e eis que num dia comum, chegando do colégio feliz por ter se formado no ensino médio, Henrique, que sempre passava por um bairro com diversos comércios, presenciou mais um corriqueiro assalto, mas dessa vez por um rapaz que havia também atirado contra o comerciante e fugia com a arma na mão. O bandido escapou, mas Henrique cometeu um erro grave, correu com medo e por estar vestido de forma simples e com uma mochila nas costas, alguns populares o apontaram como o ladrão. Henrique foi espancado por um rapaz muito alterado, foi humilhado e quase morreu ali na sarjeta. Mesmo após a chegada dos policiais, Henrique continuou como sempre, desamparado no chão por se tratar de um “bandido”. Não tomaram nenhuma atitude de urgência quanto à saúde do garoto, primeiro foram olhar o comerciante, depois ouviram a população e só então chamaram o resgate para Henrique que nesse momento já engasgava com o próprio sangue, foi socorrido, mas não resistiu, morreu sem saber por quê. Agora era estatística assim como muitos outros de sua comunidade. Mas uma coisa ele conseguiu, virou notícia! Poucos choraram sua morte, mas dezenas de outros comemoraram! Brandiam palavras de ódio e repulsa nas redes sociais, sem ao menos saber dos fatos! Sua mãe não entendia e não acreditava na culpa de seu filho – Onde está a arma? E porque levaram meu filho? – perguntava a mãe aos prantos!

Chorava todos os dias com os comentários sobre seu filho e aos poucos nutria um ódio àquelas pessoas. Como podiam falar daquela forma? Nenhum deles conhecia Henrique! O ódio se misturava a depressão que voltara a ser realidade, abandonara o emprego e de repente todos os problemas pareciam maiores do que sempre foram. Seu filho não estava ali para lhe dar esperança, o beijo no rosto antes de sair, o “Deus te abençoe” nunca mais seria proferido pela boca daquela mãe. Era o fim, nada mais tinha sentido...


Alguns meses se passaram e o real bandido foi pego no mesmo bairro na tentativa de um novo assalto. Um policial a paisana que passava por ali o pegou em flagrante. O bandido foi reconhecido pelo comerciante que havia sobrevivido após ser baleado e a arma coincidia com a bala. Era ele! No mesmo dia, na Zona Leste, naquela casa simples que um dia fora à casa de Henrique, vizinhos encontraram um corpo, já sem vida, jogado ao chão de terra batida e apertado junto ao peito um bilhete dizia:


“Antes de tudo, mentes obscuras, não culpem meu filho por isso também! Quem me matou foi tristeza de não ter a companhia da única luz que tinha nesse mundo! Mundo onde a intolerância se tornou maior que a vontade de ajudar o próximo, onde o amor, que sempre me foi negado, abandonou o coração dos homens! Sofri de tudo nessa vida, mas não posso viver na escuridão que tenta engolir a luz que era Henrique! Luz que antes me livrou da depressão! Anjo que ousou sonhar em um lugar esquecido pelo mundo, sofreu muito por suas escolhas, por querer ser alguém que o mundo dizia que ele não podia ser. No fim, neste plano, vocês venceram, mataram o sonho e o legado de um garoto que nunca fez mal a ninguém! Mas tenho certeza que em algum lugar, longe daqui, a luz de Henrique ilumina o céu e chora por aqueles que nunca entenderam o que parecia ser natural nele desde o primeiro dia, a compreensão das diferenças entre os homens e o perdão. Espero que Deus me perdoe por isso, mas esse mundo não me faz mais sentido. Adeus aos poucos que sentirão minha falta e espere por mim meu filho!”


Já perceberam como nos tornamos frios? Como a morte não nos afeta mais? Como estamos sempre justificando a maldade com nossas próprias preocupações? Existem muitos Henriques por aí, assim como existem comerciantes, mães e bandidos. Não quero aqui justificar um ou outro.


Não ouso duvidar da dor que assola o coração daqueles que perderam seus entes queridos para a criminalidade ou do ódio que toma conta de alguns, mas já pararam para pensar em como tudo que nos destrói, começa de algum modo com a intolerância? Quantas vezes nos colocamos no lugar de nossos irmãos, mesmo sabendo que talvez não façam o mesmo por nós? Não cabe aqueles que entendem e podem, fazer alguma coisa por esses que são esquecidos em nossa sociedade? A nossa omissão também não é um crime contra as crianças que nascem e crescem nesse meio? A punição deve ser justa quando necessária, para mostrar que podemos ser melhores e que sim, há esperança! O ódio só nos levará a mais tristeza!


Está na hora de nos unirmos como nação, como sociedade e como grupo que é o Brasil. Está na hora de confrontarmos o verdadeiro mal que é o Estado e sua infinita ganância ao custo de nossa paz!


Ninguém nasce bandido, ninguém nasce pra fazer o mal, mas o mal nasce nos corações aflitos! Precisamos interromper esse ciclo de intolerância, para o bem de todos nós!


 
 
 

Comentários


SEO Corpo e Mente

UM BLOG POR MAURO SOUZA 

Seu corpo em harmonia

© 2016 por Mauro Souza

SEO Corpo e Mente

bottom of page